quarta-feira, 11 de fevereiro de 2009

O norte do peregrino


Desde remotas eras o peregrino suscita emoções não negligenciáveis; ora o terror despertado pelo estrangeiro deconhecido, portador de perigos, que sempre caracterizou as aldeias, ora o possível deus que caminha sobre o mundo e agora bate em sua porta, a justificar a hospitalidade grega. A idéia da peregrinação coloca em movimento camadas arqueológicas da alma humana. Parece movê-lo para as margens de uma lembrança central perdida, ou à beira de algum abismo, em que seus antigos mêdos se reavivam.

É possível que essa mobilização se ligue ao profundo e longo processo em que o homem construiu a cultura. Explicações do mundo com que alicerçou as bases em que possa instalar-se confortável, e esquecer seu profundo medo do caos. Não seria esse um dos traços a marcar em brasa a nossa humanidade: o pavor diante a falta de sentido? Seria fato que a busca de sentido caminho junto, por estas eras, da construção do verbo, do símbolo e das descrições de um mundo palatável? Aos sentidos, pelo menos?

Talvez o peregrino suscite em nós emoções que renegam esse anseio por estabilidade? Ao propor um entregar-se a0 fluxo, nos aproximamos de algum modo da vida animal, esta ânsia por ser que parece algum dia ter nos abandonado, e da qual nostalgicamente lembramos. E que provoca aversão à toda a segurança que o estar insinua produzir.

Peregrinar então sugere estar em um tenso centro de nossa alma, dividida entre nossa natureza que se reconhece no livre jorro dos ciclos em mutação e os sentidos apreendidos por gerações ocultas, mas que encontramos enquadrando o mundo, quando a mente se encontra pronta para começar a especular e refletir sobre as condições de nossa passagem por este mundo

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